O Último Sermão Thomas Watson
Imagem cedida por: http://www.altairgermano.net/2011/01/o-ultimo-sermao-de-thomas-watson.html |
A
24 de agosto de 1662, dois mil ministros puritanos do evangelho foram
excluídos de seus púlpitos, tendo recebido a ordem de não mais pregarem
em público. O Ato de Uniformidade, baixado pelo parlamento inglês,
conhecido pelos evangélicos como a Grande Ejeção, pairava por sobre a
Inglaterra como uma nuvem espessa. Muitos líderes eclesiásticos da
Igreja Anglicana, a religião oficial, estavam forçando os puritanos a
cessarem suas prédicas ou a se moldarem à adoração litúrgica decretada
por lei. Muitos ministros preferiam o silêncio à transigência.
Com
olhos marejados de lágrimas, milhares de crentes humildes ouviram seu
último sermão no domingo imediatamente anterior à data em que o Ato se
tornaria lei. E, naquele último domingo de liberdade, os ministros
puritanos provavelmente pregaram os seus melhores sermões.
O sermão que passamos a transcrever, de modo um tanto abreviado, foi pregado por Thomas Watson a seu pequeno rebanho.
Antes
que eu me vá, devo oferecer alguns conselhos e orientações para vossas
almas. Eis as vinte instruções que tenho a dar a cada um de vós, para as
quais desejo a mais especial atenção:
2) Coleciona
bons livros em casa. Os livros de qualidade são como fontes que contêm a
água da vida, com a qual poderás refrigerar-te. Quando descobrires um
arrepio de frio em tua alma, lê esses livros, onde poderás ficar
familiarizado com aquelas verdades que aquecem e afetam o coração.
3) Tem
cuidado com as más companhias. Evita qualquer familiaridade
desnecessária com os pecadores. Ninguém pode apanhar a saúde de outrem;
mas pode-se apanhar doenças. E a doença do pecado é altamente
transmissível.
4) Cuidado
com o que ouves. Existem certas pessoas que, com seus modos sutis,
aprendem a arte de misturar o erro com a verdade e de oferecer veneno em
uma taça de ouro. Nosso Salvador, Jesus Cristo, aconselhou-nos:
“Acautelai-vos dos falsos profetas, que se vos apresentam disfarçados
em ovelhas, mas por dentro são lobos roubadores” (Mt 7.15).
5) Segue
a sinceridade. Sê o que pareces ser. Não sejas como os remadores, que
olham para um lado e remam para outro. Não olhes para o céu, com tua
profissão de fé, para, então, remar em direção ao inferno, com tuas
práticas. Não finjas ter o amor de Deus, ao mesmo tempo que amas o
pecado. A piedade fingida é uma dupla iniqüidade.
6) Nunca
te esqueças da prática do auto-exame. Estabelece um tribunal em tua
própria alma. Tem receio tanto de uma santidade mascarada quanto de
ires para um céu pintado. Julgas-te bom porque outros assim pensam de
ti?
7) Mantém
vigilância quanto à tua vida espiritual. O coração é um instrumento
sutil, que gosta de sorver a vaidade; e, se não usarmos de cautela,
atrai-nos, como uma isca, para o pecado. O crente precisa estar
constantemente alerta.
8) O
povo de Deus deve reunir-se com freqüência. As pombas de Cristo devem
andar unidas. Assim, um crente ajudará a aquecer ao outro. Um conselho
pode efetuar tanto bem quanto uma pregação. “Então, os que temiam ao
Senhor falavam uns aos outros” (Ml 3.16).
9) Que
o teu coração seja elevado acima do mundo. “Pensai nas coisas lá do
alto” (Cl 3.2). Podemos ver o reflexo da lua na superfície da água, mas
ela mesma está acima, no firmamento. Assim também, ainda que o crente
ande aqui em baixo, o seu coração deve estar fixado nas glórias do alto.
10) Consola-te
com as promessas de Deus. As promessas são grandes suportes para a fé,
que vive nas promessas do mesmo modo que o peixe vive na água. As
promessas de Deus são quais balsas flutuantes que nos impedem de
afundar, quando entramos nas águas da aflição. As promessas são doces
cachos de uvas produzidos por Cristo, a videira verdadeira.
11) Não
sejas ocioso, mas trabalha para ganhar o teu sustento. Estou certo de
que o mesmo Deus que disse: “Lembra-te do dia de sábado, para o
santificar”, também disse: “Seis dias trabalharás e farás toda a tua
obra”. Deus jamais apoiou qualquer ociosidade.
12) Ajunta
a primeira tábua da Lei à segunda, isto é, piedade para com Deus e
eqüidade para com o próximo. O apóstolo Paulo reúne essas duas idéias,
em um só versículo: “Vivamos, no presente século... justa e
piedosamente” (Tt 2.12). A justiça se refere à moralidade; a piedade diz
respeito à santidade.
13) Em
teu andar perante os outros, une a inocência à prudência. “Sede,
portanto, prudentes como as serpentes e símplices como as pombas” (Mt
10.16). Devemos incluir a inocência em nossa sabedoria, pois doutro modo
tal sabedoria não passará de astúcia; e precisamos incluir sabedoria em
nossa inocência, pois do contrário nossa inocência será apenas
fraqueza.
14) Tenha
mais medo do pecado que dos sofrimentos. Sob o sofrimento, a alma pode
manter-se tranqüila. Porém, quando um homem peca voluntariamente, perde
toda a sua paz. Aquele que comete um pecado para evitar o sofrimento,
assemelha-se ao indivíduo que permite sua cabeça ser ferida, para evitar
danos ao seu escudo e capacete.
15) Foge
da idolatria. “Filhinhos, guardai-vos dos ídolos” (1 Jo 5.21). A
idolatria consiste numa imagem de ciúme que provoca a Deus. Guarda-te
dos ídolos e tem cuidado com as superstições.
16) Não
desprezes a piedade por estar sendo ela perseguida. Homens ímpios,
quando instigados por Satanás, vituperam, maliciosamente, o caminho de
Deus.
17) Não
dá valor ao pecado por estar atualmente na moda. Não julga o pecado
como coisa apreciável, só porque a maioria segue tal caminho. Pensamos
bem sobre uma praga, só porque ela se torna tão generalizada e atinge a
tantos? “E não sejais cúmplices nas obras infrutíferas das trevas;
antes, porém, reprovai-as” (Ef 5.11).
18) No
que diz respeito à vida cristã, serve a Deus com todas as tuas forças.
Deveríamos fazer por nosso Deus tudo quanto está no nosso alcance.
Deveríamos servi-Lo com toda a nossa energia, posto que a sepultura está
tão perto, e ali ninguém ora nem se arrepende. Nosso tempo é curto
demais, pelo que também o nosso zelo de Deus deveria ser intenso. “Sede
fervorosos de espírito, servindo ao Senhor” (Rm 12.11).
19) Faze
aos outros todo o bem que puderes, enquanto tiveres vida. Labuta por
ser útil às almas de teus semelhantes e por suprir as necessidades
alheias. Jesus Cristo foi uma bênção pública no mundo. Ele saiu a fazer o
bem.
20) Medita
todos os dias sobre a eternidade. Pois talvez seja questão de poucos
dias ou de poucas horas — haveremos de embarcar através do oceano da
eternidade. A eternidade é uma condição de desgraça eterna ou de
felicidade eterna. A cada dia, passa algum tempo a refletir a respeito
da eternidade.
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